É POSSÍVEL SER SUSTENTÁVEL?

Cada vez mais o conceito de sustentabilidade ganha força e se incorpora ao desenvolvimento social e econômico. Entretanto, pouco é divulgado sobre quais são as dificuldades de se ter esse tipo de prática e até que ponto elas podem ser implementadas. Conheça propriedades rurais, empresas e construções que deram o seu primeiro passo em iniciativas sustentáveis.

Por Fernando Santos, Gabriel Bonfim e Graziela Ramos

Por que não na área rural?

Quando pensamos em chácaras, sítios ou até mesmo fazendas, uma das primeiras coisas que nos vêm à mente é a paz, a tranquilidade e o sossego que esses locais podem nos passar, fora é lógico, o ar puro de uma terra que nunca viu asfalto. Esse contato direto com a natureza e o seu afastamento da correria cotidiana pode ser considerado um alívio para quase 85% da população  que reside na área urbana, segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), em 2015.

Entretanto, por muitas vezes, esse distanciamento da área rural em relação à cidade, como também a falta de investimentos nesses locais, pode acarretar dificuldades na implementação de ações que possam ser benéficas ao meio ambiente e que, ao mesmo tempo, acatem os princípios da sustentabilidade.

De acordo com dados de 2011 da PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos), apenas 31,6% das propriedades rurais no Brasil tem um serviço de coleta de lixo rural correto. A grande maioria queima, enterra ou lança os resíduos em terrenos baldios, lagos, rios ou açudes. 

O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estástica) também aponta a distribuição percentual de moradores rurais por tipo de destino de lixo. Em 2015, mais da metade dos resíduos encontrados em propriedades rurais foram queimados,  expondo assim uma situação preocupante.

Pensando nisso, Henzo Henrique Simionatto, engenheiro ambiental sanitarista, criou, ainda quando estudava sua graduação, um projeto de pesquisa chamado “Gerenciamento de Resíduos Sólidos em Propriedades Rurais de Pequeno Porte em Tupi Paulista – SP”. O objetivo é promover a coleta seletiva de maneira adequada nas propriedades rurais de seu município por meio de ecobags instaladas na zona rural, nas quais  o proprietário pode descartar o lixo reciclável. Pela proposta, uma vez por semana o material seria recolhido pela cooperativa da cidade.

O projeto incorpora o tripé da sustentabilidade, uma vez que ajuda financeiramente famílias que trabalham na cooperativa, as propriedades rurais e o meio ambiente (Foto: Graziela Ramos)

Segundo Simionatto, a proposta veio da indignação de não ter esse tipo de atenção nas propriedades rurais, fato que ele observava há tempos, uma vez que seu pai é um produtor rural de hortaliças. Por que não, na zona rural? A zona rural como a área urbana também precisa de uma separação, de uma segregação, de uma saúde ambiental”, afirma Henzo.

OUÇA HENZO SIMIONATTO EXPLICANDO OS BENEFÍCIOS DO SEU PROJETO

Dessa forma, com ajuda da coordenadora do Meio Ambiente no município, Lourdes Alves Grassi, e da sua professora e tutora da Unoeste (Universidade do Oeste Paulista), Leila Misturatto, houve a implantação, de maneira gradual, da coleta seletiva no campo. Entretanto eles temiam que esse projeto poderia não dar certo, uma vez que não tiveram suporte para a implementação.

Lourdes Grassi, coordenadora do meio ambiente do município; Maria Rosa, proprietária; e Henzo Simionatto, idealizador do projeto “Gerenciamento de Resíduos Sólidos em Propriedades Rurais de Pequeno Porte” ao lado das ecobags (Foto: Graziela Ramos)

O projeto começou em 2018, com 18 propriedades rurais, do bairro Barro Brito, no município de Tupi Paulista. Posteriormente, vizinhos começaram a indagar por que não havia expandido para outras localidades. Desse modo, os próprios proprietários começaram a ter a iniciativa de separar o lixo e levar até os locais que tinham a coleta. 

Percebeu-se, então, a necessidade de melhorar e expandir o programa, que em 2021 já atende 130 propriedades no município, sendo uma delas o sítio Maria Rosa de Ferri.

A proprietária conta que sempre procurou separar o lixo reciclável e fazer o correto em sua propriedade, guardando e levando na cidade. Entretanto, ela afirma que antigamente as pessoas não tinham muito esse tipo de conhecimento. Já seu Albilio conta que foram só vantagens tanto ambientais como econômicas ter este tipo de conduta para com os materiais reutilizáveis.

Sitio Dona Maria Rosa,

localizado no distrito de Oásis, 

em Tupi Paulista .

Os proprietários são o casal

Maria Rosa de Ferri, 61 anos, e

Albilio Ferri, 70 anos.

 

“Quando eu era criança, a gente nem sabia o que era isso [coleta seletiva], porém quando vinha algum carroceiro, a gente recolhia, juntava e dava para esse senhor da carroça vender lata velha, plástico. Ninguém falava. Porém, havia vezes que meu pai queimava”, afirma Maria Rosa.

“Em primeiro lugar é uma maneira de você deixar a sua propriedade sem esses resíduos. Com mais facilidade a gente junta e as pessoas levam [o lixo reciclável]. Do outro lado estamos ajudando as pessoas a viver também, por que é uma coisa que vale dinheiro hoje”, conta Albilio.

Iniciativas simples e sustentáveis

O casal, além de ter a iniciativa de participar do projeto, também compartilha de muitas outras atitudes que auxiliam para o meio ambiente. Veja algumas!

CAIXA DE ÁGUA

Planejada pelo próprio casal para servir como uma fonte de reaproveitamento da água pluvial.

RASPADOR DE LAMA

Feita a partir de tampinhas de garrafas, remove o barro dos sapatos antes de entrar na casa.

JARDIM DE PNEUS

Evita que o objeto seja descartado incorretamente, além de servir como decoração.

INSTALAÇÃO DE CANOS

Captam o líquido rejeitado de pias de cozinha, banheiros e lavanderias, depois serve como irrigação.

A sobrevivência por meio da água

Ainda falando sobre a dificuldade de implementação de atitudes sustentáveis em áreas rurais, na cidade de Presidente Prudente, neste ano, foi pré-instalado um projeto estadual, que conta com um recurso repassado de R$1.015.337 pela Agência Nacional de Água e  Saneamento Básico, chamado “Bacia Hidrográfica do Alto curso do Rio Santo Anastácio”. O principal objetivo é revitalizar o manancial do Rio Santo Anastácio, visto que este fornece boa parte da água, que é utilizada pela população da cidade e se encontra atualmente degradada.

Segundo Igor Cabreira, engenheiro agrônomo responsável, para tal desenvolvimento, o projeto conta com ações voluntárias dos proprietários rurais, uma vez que boa parte da bacia se encontra na zona rural. As principais atitudes implantadas foram manejo e conservação de solo, recomposição florestal nas áreas de preservação permanente, além de atitudes para reduzir erosões e carreamento de solo.

Igor Cabreira em uma das reuniões com os proprietários rurais que aderiram o projeto Bacia do Rio Santo Anastácio (Foto cedida: Igor Cabreira)

A intenção do projeto não é que o produtor rural arque financeiramente com todas as ações feitas em sua propriedade, mas sim que ele seja pago pelo município para fazê-las. “Futuramente, a partir do momento este projeto tiver estruturado, é o município desenvolver essa ferramenta de provedor e beneficiário, para que ele [produtor rural] possa até mesmo receber para que continue investindo nas melhorias dentro da sua própria propriedade", esclarece.

Entretanto, de aproximadamente 200 propriedades rurais, instaladas na região, apenas 10% aderiram ao projeto. Fato que pode ser explicado, segundo Cabreira, por questões culturais. “Antigamente, havia-se uma visão que, para se ter a expansão do desenvolvimento agrícola, precisava-se do desmatamento, formações de pastagens etc, e isto ficou alicerçado na cultura dos produtores mais antigos, que pensam que a questão ambiental não é tão importante”.

Desse modo, o foco do projeto também é fazer a conscientização ambiental para tentar mudar, aos poucos, essa visão retrógrada de alguns proprietários, a fim de expandir o programa na cidade e em outras regiões.

“Esse programa, depende muito da educação ambiental que pode vir através de muitas ferramentas, como a própria educação ambiental nas escolas, a fim de atingir um público mais jovem, além de ferramentas que possam atingir o público mais antigo, como divulgações no rádio e na mídia, como também reuniões”, explica Cabreira. Porém, ele também afirma que os proprietários mais resistentes só aderirão ao programa quando virem de fato resultados em propriedades vizinhas. “Eles só vão acreditar no projeto quando eles passarem a enxergar os seus benefícios em outras propriedades”.

Construções sustentáveis

O desenvolvimento sustentável está cada vez mais presente nas discussões ao redor do globo, assim como nas diversas áreas da atividade humana. Na área da arquitetura isso não é diferente e atualmente muito se fala em projetos arquitetônicos “sustentáveis”. Será mesmo possível se perpetuar em um espaço sem gerar impactos ao meio ambiente? 

De acordo com o arquiteto, Gabriel Gazoni isso é um paradoxo. Ele diz que o simples fato da ocupação do meio pelo ser humano já gera um impacto, logo o termo construção sustentável perde já aí seu sentido quando se olhar por essa ótica.

Então, o que é uma construção sustentável? Para o arquiteto, o que se entende como construção “sustentável” é ato de se pensar em práticas desde a fundação do projeto que possam gerar o menor impacto possível ao meio ambiente. 

Um exemplo de construção com práticas que buscam minimizar esses impactos é a casa de Homéro Ferreira, pai de Gabriel. A moradia foi construída com o uso de técnicas de construção mistas a exemplo das divisões das áreas internas feitas em drywall. A opção, além de acelerar o processo de construção, acabou gerando menos detritos durante a obra.

Por mais que, em seu projeto arquitetônico, Gabriel tenha pensado em reduzir os danos ao meio ambiente, ele mesmo não o considera como sustentável. Gabriel entende que a narrativa da “sustentabilidade” na atualidade é difundida de maneira errônea, pois o ser humano em si sempre irá gerar algum tipo de impacto no meio em que se instala, mas a responsabilidade de mitigar esses danos já deveria ser algo difundido na sociedade. “A gente tentar pensar a respeito dos impactos que causamos na sociedade e, ao mesmo tempo, isso não deveria ser nenhuma novidade, isso deveria ser arquitetura pura e simples, deveria estar inserido nas na vida das pessoas”, afirma.

O Centro Cultural Matarazzo, em Presidente Prudente também pode ser considerado um exemplo de proposta de construção sustentável em nossa região, uma vez que apresenta iniciativas como pavimento permeável, cobertura vegetal (grama), torneiras com temporizadores, sensores de presença e de movimento para reduzir o consumo de energia, além de uma horta cujos produtos são utilizados pelos próprios funcionários, em suas refeições

José Fábio Sousa Nogueira, idealizador do projeto no Centro Cultural e coordenador das obras, afirma que a responsabilidade de pensar em construções que não geram tanto impacto ao meio ambiente deve ser também do poder governamental. “Não adianta exigir somente da população ou da iniciativa privada, o poder público tem que dar exemplo”. Ele lembra que a instituição já foi exemplo de empreendedorismo sustentável em congressos em Brasília. Nogueira ainda afirma que ainda existem mais projetos sustentáveis para serem feitos na entidade e que o atual governo municipal não está muito preocupado com essas ações.

Empreendimentos sustentáveis

A sustentabilidade é fundamental para preservar o meio ambiente e assim garantir a saúde e o bem-estar para a população tanto da geração atual como das futuras. Pensando nisso, empresas adotam ações sustentáveis em seu processo de desenvolvimento de produção, evidenciando a importância da preservação do meio ambiente.

Um exemplo disso é a Arenales Homeopatia Animal. A empresa faz o reaproveitamento de água da chuva, tem ações de reflorestamento e de reciclagem das embalagens de seus produtos. Lá também é utilizada uma ação sustentável bem simples: a horta, que é adubada utilizando o processo de compostagem de resíduos alimentícios produzidos pelo empreendimento.

Já o Colégio Arte Livre, do Sistema Objetivo, conscientiza seus alunos sobre a importância da sustentabilidade por meio de projetos. Dentre as ações está o plantio de mudas, que são distribuídas aos alunos e a comunidade; a coleta de material reciclável pelas ruas da cidade; e o uso da energia fotovoltaica. A instituição chegou até a ONU servindo de exemplo às escolas do mundo de como adotar ações em benefício do meio ambiente.