DO CARNAVAL AO TEATRO INTIMISTA

Manifestação de rua serve de base para artista pernambucano que transita entre universos dispares.

Por: Thamires Ferreira

O corpo coberto de fitas sacode no ar e rodopia conforme a batida. Ao som dos tambores e trompetes a mesma criatura convida quem assiste a participar do cortejo em homenagem a ela. Com estandarte em punho uma mulher de vestido vermelho conduz músicos e público rumo ao palco da apresentação com ares de carnaval.

As roupas de cetim enfeitadas com lantejoulas completam o cenário. O palco cru e arquibancada logo são ocupados. Todos a postos.

Enfim é anunciada a festa de aniversário do Boi Marinho.

De acordo com Helder Vasconcelos, idealizador do Boi, o espetáculo Na Pisada do Carnaval, apresentado neste mês de agosto em Presidente Prudente, traz em sua essência parte do carnaval de Recife. “A ideia é que a temperatura da festa chegue a essas pessoas através da dança.”

Essa manifestação artística já é tradição em Pernambuco, Maranhão e Santa Catarina. Possui estrutura e formas definidas, e ao mesmo tempo é muito diversificada. Helder criou uma nova versão dentro do arquétipo conhecido do Cavalo Marinho (teatro de rua) e do Maracatu Rural (elemento do carnaval de Recife).

Sem demora a timidez inicial de quem assiste parece sair pelas extremidades do corpo. Mãos, pés e cabeça não resistem mais ao ritmo, e sacodem conforme o compasso. Inebriados pela canção entoada a plenos pulmões por homens e mulheres de sotaque nordestino, começam a primeiras palmas.

“Vão acontecendo mostras de dança para apresentar os integrantes do cortejo. Nessa diversidade de coreografias convidamos o público a cantar junto e entrar na roda também”. Logo, os mais corajosos levantam e se rendem à alegria proporcionada pela apresentação.

Para o professor Ribas Dantas, que acompanhou desenrolar dessa história musical, “a arte está aberta pra qualquer um principalmente essa cultura popular.”

Helder Vasconcelos atua em diversas áreas, ele é músico, ator e dançarino. Criado em Caruaru – agreste de Pernambuco, cresceu em meio a procissões e bandas de pífano. Membro da geração de musicistas nascidos no inicio dos anos 1990, o grupo “Mestre Ambrósio”, assim como “Nação Zumbi” de Chico Science, “Mundo livre S.A” e tantos outros desempenharam o importante papel de revelar novas possibilidades ao cenário da música brasileira.

Em entrevista para a Prisma relata a honra de representar no sudeste a própria terra natal. “É como olhar para o umbigo. A Arte tem essa característica. Naquela época começou-se a perceber a riqueza da dança e do teatro em Pernambuco.”

Espiral Brinquedo Meu, encenado no Parque do Povo em outra noite de apresentações, teve inúmeras peculiaridades. Apesar do espaço reservado ao público, muitos assistiam de longe, receosos a princípio.

Mais intimista, porém não menos sonoro, Espiral questiona o espectador a todo instante. Parte de um projeto solo, “foi uma forma de expressão autobiográfica. Essa investigação interna se satisfaz no palco”, afirma Helder. Repleto de silêncios faz com que o humor oscile da tristeza a alegria durante os atos. Provoca estranhamento, mas leva à reflexão.

Não por menos esse monólogo foi criado para teatros fechados. Adaptado ao longo do tempo, hoje é encenado em diversas circunstâncias. Para a jornalista Alana Vitorino, que costuma prestigiar mais teatros de rua do que tradicionais, a apresentação foi muito interessante. “Acho importante haver espaço para cultura popular em outros lugares, para que as pessoas tenham acesso, e neste caso ainda trouxe a rica cultura do nordeste. Quanto mais expandir melhor.

Tarefa aparentemente cumprida por Espiral Brinquedo Meu que teve as cadeiras e almofadas no chão ocupadas gradualmente durante o espetáculo. Sem o compromisso das apresentações entre quatro paredes, quem passeava naquela noite de sexta-feira no Parque do Povo, encontrou em um canto qualquer uma oportunidade para prestigiar a arte, e voltou pra casa com algo em que pensar.

Intervenções urbanas são ações desenvolvidas em prol da sociedade que modificam o ambiente. Isso inclui monumentos arquitetônicos, apresentações de artistas de rua, de teatro, malabares, ou estatuas vivas, até as manifestações artísticas visuais como grafite e exposições a céu aberto. De acordo com a professora de Arquitetura e Urbanismo da Unoeste Yeda Ruiz, responsável pelo projeto “Valorização do espaço público e da paisagem urbana”, áreas públicas agregam qualidade ao meio urbano quando implantam condições de funcionalidade e sociabilidade.

“Uma intervenção urbana ‘estética’ atribui melhorias a um espaço, outras vezes é necessário um intervenção urbana física, ou então uma intervenção social e educacional.” Para a educadora essas intervenções trazem a tona a identidade coletiva. “A meu ver elas atiçam o poder de crítica da comunidade, de reconhecimento de direitos e da sensação de pertencimento ao espaço.” No caso do Urbanismo, antes de intervir em um espaço é necessário “ler” as pessoas e o local. “A ideia agora é de em setembro trazer para o Campus II uma exposição com os resultados e as leituras de quem usufruiu do espaço”.

O professor de Arte e Midia da faculdade de Comunicação Social Josué Pantaleão realiza intervenções com as turmas. Para ele ações como essa geralmente fazem críticas sociais. Um exemplo foi a intervenção “Como você viveria sem elas?”, em que o docente instigou a reflexão sobre o fim de algumas das marcas mais presentes no cotidiano das pessoas. ´Segundo Pantaleão “é uma das formas com que a arte se manifesta, atingindo vários grupos sociais, interagindo com sociedade e governo”.

AS VÁRIAS FACES DE UM ARTISTA