As dificuldades dentro do acampamento

Cícero Bezerra De Lima era morador de Nova Pátria e encontrou na luta pela terra uma maneira de viver do próprio negócio.

Por: Mariane Ferreira

A luta pela terra

O que influenciou você a ir acampar? Por que você quis ir acampar?

Foi com o intuito de não ser mais empregado, não trabalhar mais de empregado, tentar trabalhar para a gente mesmo.

E quando você foi, o que você encontrou lá? Como que era acampar?

Naquela época lá, era o ano de 1996. Era uma época muito difícil, quando fundaram a UDR (União Democrática Ruralista), lá da burguesia dos fazendeiros. Nós saímos da fazenda Santa Rita num conflito agrário na época da novela o Rei do Gado. Naquela época fomos para Santa Terezinha, em Santo Anastácio, lá nós montamos o acampamento na beira da fazenda. Voltamos para o Antônio Conselheiro lá no Mirante, também se montou uma guarita de seguranças armados. Antes, na fazenda, quando a gente estava na fazenda Santa Rita, do Marcelo Negrão, em Teodoro, nós ocupamos outro espaço, não me recordo o nome, num domingo umas 14h da tarde. Só que os acampamentos eram muito organizados, esse último acampamento do Mirante do Paranapanema chamado Antônio Conselheiro tinha 800 famílias morando, era uma cidade. Para você ter ideia, em dia de sábado tinha 3 bailes, tinha missa, tinha dia de domingo de manhã missa, culto evangélico, tinha de tudo, tinha farmácia, tinha, era muita gente mesmo.

Como que vocês decidiam que momento entravam na fazenda?

Então, não era a gente que decidia na época. Tinha uma cúpula, o MST tinha uma, tinha as lideranças e eles que decidiam pela gente. Tomavam as decisões e eles sabiam exatamente a época, hora e o momento de fazer as ocupações de terra, que a sociedade chama de invasões. A sociedade lá fora chama de invasão, nós chamamos de ocupação.

Qual foi a maior dificuldade que você enfrentou no acampamento?

De moradia? As dificuldade eram todas. Você morava embaixo de um barraco de lona, sem água, sem estrutura, sem banheiro, sem nada. Eram todas dificuldades imagináveis. A comida, o governo mandava uma cesta básica de vez em quando e a gente tinha que se virar.

A conquista

Quando que você teve as terras?

Então, eu entrei em 96 no acampamento na Santa Rita, depois fomos pra Santa Terezinha, então voltamos para mirante, no Antônio conselheiro e em janeiro de 98 nós ocupamos essa fazenda em definitivo. Ocupamos, ficamos na sede, montamos acampamentos e o fazendeiro já estava negociando com o ITESP. Esse é um dos poucos fazendeiros que negociou sem precisar conflito nenhum. Ele negociou a área dele, aí nós ficamos na sede, esperamos seis meses. Dia 30 de julho de 98 viemos para o lote. Foi mais dificuldade ainda. Imagina você dentro de um quadrado de terra, o pasto dessa altura com barraco de lona e sem água, tinha que cavar um buraco, cavar um poço, foi difícil, mas foi bom, foi bom ser livre.

Mas teve ajuda, ou vocês ficaram por conta própria? Tiveram que fazer tudo?

Não, nós ficamos dois anos sem recurso, pouco recurso, pouca coisa aí do Itesp, coisinha mínima. Em 2000 que saiu o PRONAF, que é um dinheiro para investimento. Na época veio a luz, que foi um projeto de energia. Nós tivemos que pagar, nós pagamos por dois anos ela parcelado, foi aí que começou a melhorar mais. Mas dois anos foi difícil mesmo, a luz de vela, lamparina.

Qual é a principal diferença de um acampamento para um assentamento?

A diferença que você conquistou seu objetivo, você lutava por aquilo e aconteceu aquilo e eu não sei se tem muita diferença porque a dificuldade do acampamento é grande e a dificuldade quando você pega o lote também é grande, não tem nada fácil para você chegar nesse ponto aqui, nessas coisinhas aqui é difícil.

Por que que você escolheu o município de Presidente Bernardes?

Então, na época que nós estávamos no acampamento Antônio Conselheiro, tinha um grupo grande de mais de vinte famílias de Bernardes lá, entendeu? E na época teve uma grande demanda, saiu várias áreas. Dessa forma, o MST mandou de preferência as pessoas dos municípios que estavam lá para os municípios que tivesse área, entendeu? E aqui tinha duas áreas, essa e a Santo Antônio. Ai nós optamos por essa e a gente veio pra cá, que ai você já tinha mais um contato com um prefeito, você já estava mais familiarizado aqui na região.

A luta hoje nos assentamentos

Você vê uma diferença nas pessoas que acamparam na época que você acampou pra hoje? Quais?

Tem várias diferenças. Então, não tem por causa da realidade que o país se encontra hoje. Hoje o pessoal vem pro acampamento dia de sábado, tudo de carro novo, difícil vir em uma moto, vem tudo de carro novo pros acampamentos. Fica ali o sábado, o domingo e na segunda feira vai embora trabalhar. Na época ninguém tinha carro, você ia para o acampamento morar, você ia trabalhar de bóia (sic) fria nos acampamentos que vinha ônibus lá buscar, mas a diferença hoje é grande.

Você disse que depende da condição em que o país se encontra. Você acha que devido isso a reforma agrária teve uma queda?

Tá, no país inteiro. O pontal inteiro, porque o pessoal fala que o governo fez reforma agrária, mas não fez reforma agrária em lugar nenhum. Quem fez foi o povo, o pessoal que fez acontecer, porque senão, não precisava eu sair pra ir pro acampamento. O estado ia lá desapropriava o fazendeiro, fazia a seleção. Em nova pátria mesmo quem tinha perfil pra ir pra terra ia, era o justo, mas você quem tem que fazer tudo, você que tem que forçar o fazendeiro ir lá negociar com o ITESP e as vezes forçar o ITESP ir lá negociar com os fazendeiros porque é uma má vontade dos dois que só por Deus.

CÍCERO BEZERRA DE LIMA

ASSENTAMENTO FLORESTAN FERNANDES LOTE: 05

DATA DA ENTREVISTA: 09/07 – 16h

Meio: Pessoalmente (Usado gravador)

A novela “O Rei do Gado” da Rede Globo, influenciou Cícero a ir em busca de um pedaço de terra, a música tema o traz boas recordações até hoje:

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