Luz, som e palavra

Descubra como referências culturais sobre livros, músicas ou filmes se refletem na vida das pessoas.

Por: Violeta Araki

É uma cena gravada na memória de muitos. Lá está a moça loira tomando tranquilamente uma ducha sem ao menos suspeitar que do outro lado da cortina do banheiro o assassino mais emblemático dos anos de 1960 a observa. À medida que o criminoso avança com um punhal, mais e mais tensa se torna a trilha sonora, até que por fim a mulher sucumbe aos golpes mortais.

Em Psicose (1960, Shamley Productions, Inc), Antony Perkins e Janet Leigh protagonizaram uma das tomadas de maior suspense do diretor Alfred Hitchcok. Foi um marco no gênero para o cinema da época. Revivida direta ou indiretamente incontáveis vezes em seriados, desenhos e até outros filmes, a cena clássica relembra um dos muitos filmes que vêm à mente das pessoas quando se fala em sétima arte.

Mas nem só o cinema traz referências, analogias e inspiração. No universo da música e da literatura também não faltam exemplos de produções que afloram na lembrança, afinal, todos nós temos referências culturais. Elas aparecem naquilo que criamos, se refletem no que escrevemos, falamos e até na maneira de agirmos.

É algo sempre próximo a nós. Há frequentemente marcas de outras pessoas no seu próprio mundo, talvez só passem despercebidas em algumas ocasiões.

O músico Paulo Moreira puxou o que havia de melhor nos grandes saxofonistas do passado e do presente para construir sua própria identidade como instrumentista. Assim, gerou uma marca só dele. “Espero sempre que minha música gere transformação e as pessoas saiam um pouquinho diferente do que entraram”, diz. Nesta reportagem, você vai descobrir como e porquê nossos entrevistados tiveram suas vidas marcadas por todas essas referências culturais.

Viaje por um mundo repleto de personagens, autores, diretores, músicos, canções e histórias inesquecíveis.

Paulo Moreira

É possível tirar mais que notas de um instrumento? O saxofonista Paulo Moreira garante que sim e sopra com emoção e sensibilidade

“Espero sempre que minha música gere transformação e as pessoas saiam um pouquinho diferente do que entraram”, diz o saxofonista Paulo Moreira

A primeira vez que Paulo Moreira viu um saxofone foi no filme Loucademia de Polícia (o primeiro foi lançado em 1984 pela Warner Bros.). “Um dia ainda vou tocar esse instrumento”, pensou. Na adolescência participou de bandas marciais, mas foi só aos 18 anos que conseguiu comprar seu primeiro sax, inseparável companheiro desde então. Paulo estudou uma temporada em Tatuí, fez cursos com alguns saxofonistas, mas certifica que é pelo menos 80 autodidata.

Em 2008, iniciou o projeto instrumental “Som de Sax” e assumiu verdadeiramente a carreira musical. Entre suas principais referências de saxofonistas figuram Leo Gandeman, Marcelo Martins (saxofonista do Djavan), Erik Marienthal e Kirk Whalum.

“Felizmente nasci na década de 1980, que teve uma boa safra musical. Da nossa música brasileira posso apontar como principais referências Tom Jobim, Lulu Santos, Titãs, Kid Abelha, Clube da Esquina (Flávio Venturini, Beto Guedes, Milton Nascimento, Lô Borges, 14 Bis, entre outros), Phil Collins, Jamiroquai”, cita o saxofonista, com tantos outros nomes desfilando em sua cabeça.

Mas 30 anos depois daquela geração de ouro, na visão de Paulo, o cenário atual da música lhe parece fugaz. “Antigamente, você contava uma história, discursava uma poesia. Hoje a música às vezes é pretexto para dancinha. Você nem lembra o que ela fala”, lamenta.

Subordinada à cultura de massa, a indústria musical cada vez mais cria tentáculos que aprisionam os neurônios com versos “chiclete”, cuja vida útil só existe enquanto as pessoas não se enjoarem de repetir a mesma frase. E geralmente enjoam, como observa Paulo. “A indústria fonográfica criou um monstro que nem ela mesma consegue matar. Vende bem aquilo que entra fácil na mente das pessoas”, critica. Para ele, a música deveria ser tratada mais do que simples entretenimento descartável.

“Qual o caminho de volta? Eu não sei, mas tento fazer minha parte hoje, tento usar a música com a função cultural, educacional e de resgate de valores. Espero sempre que minha música gere transformação e as pessoas saiam um pouquinho diferente do que entraram.”

Nessa toada em que Paulo leva seu ofício e sua paixão, ele não se priva de aproveitar o que há de melhor em cada músico para agregar em seu trabalho.Também pudera, já teve a honra de tocar ao lado de George Israel (guitarrista do Kid Abelha), Roupa Nova e The Platters.

Ao reconhecer que cada instrumentista tem uma assinatura ao tocar, como se fosse uma identidade, ele afirma existir sempre algo inimitável, que pode até estar no jeito de assoprar. E quando assopram, espalham no ar emoção e sensibilidade.

 

Acordes que vão para as telonas

Há tempos que canções têm inspirado filmes, acompanhe alguns exemplos:

Yellow Submarine”, dos Beatles, deu origem à animação Submarino Amarelo, de 1968, com direção de George Dunning.;

A canção “Oh, Pretty Woman”, de Roy Orbison inspirou o diretor Garry Marshall a criar a famosa história de amor inusitado entre um rico, charmoso e bem sucedido empresário (Richard Gere) com uma prostituta (Julia Roberts) do filme Uma linda Mulher;

O filme nacional Faroeste Caboclo tem seu roteiro inspirado na música homônima da banda Legião Urbana.

 

Veja mais listas:

http://rollingstone.uol.com.br/galeria/dez-filmes-inspirados-em-cancoes/#imagem3 

http://www.ochaplin.com/2013/04/listas-musicas-que-inspiraram-filmes.html 

Rubens Shirassu Jr.

Os clássicos vivem para sempre nos autores que continuam a buscar inspiração nos grandes nomes da literatura. Descubra com a história do escritor prudentino Rubens Shirassu Jr. como eles são capazes de resistir ao tempo.

O escritor Rubens Shirassu Jr. com o primeiro livro que ganhou de seu pai, aos 10 anos.

Era uma viagem sem volta. Estava inteiramente possuído por ela e pela forma sagaz como ela o conduzia naquele desconcertante jogo de suspense. Ele era apenas um garoto que podia muito bem amar os Beatles e os Rollings Stones, mas acabou verdadeiramente apaixonado pela literatura. Lúcia Machado de Almeida foi quem despertou este encanto em sua adolescência.

Para o escritor prudentino Rubens Shirassu Jr., O escaravelho do diabo foi o livro que mais teve impacto quando garoto. “Acho incrível a maneira como a Lúcia construiu este romance policial, realmente feito para a gente devorar. E eu até ficava roteirizando em quadrinhos a história”, afirma.

Apesar de ter sido decisivo pelo fato de o impulsionar a escrever, O escaravelho do diabo não foi o única obra que marcou a juventude de Rubens. Quando volta um pouco mais ao passado, também se lembra de Meu Pé de Laranja Lima (de José Mauro de Vasconcelos), livro que ganhou de seu pai aos 10 anos e que resiste ao tempo. “Até hoje tenho ele guardado”, diz.

Mais tarde, a porta continuou aberta para que outros autores entrassem em sua vida. Um a um, foram tomando espaço até a casa ficar cheia de livros e a mente de Rubens, cheia de ideias. Não demorou para que também se sentisse encorajado a fazer parte do time de escritores e logo seus textos já figuravam nas páginas de um jornal de Brasília. Vieram poesias, crônicas, resenhas e, em pouco tempo, os primeiros livros.

Em sua produção a imagem sempre teve influência muito forte. “Se eu não conseguir visualizar a cena, não dá para escrever”, argumenta. No livro de poemas Cobra de Vidro, por exemplo, Rubens explora o surrealismo em vários textos, herança de outras referências literárias, como o poeta surrealista Murilo Mendes e os hai-kais (aqui dá para linkar para a pessoa saber o que é hai-kai) japoneses.

Escreve ele na poesia Teu riso: “Guardo a primavera das borboletas sem voz/dançando veludosamente / o sentido está enclausurado/ conchas do mar/ rosto com que te miro/ no período vento/ a teu ouvido// no teu sorriso suspenso/como um beijo malogrado.”

Principalmente na literatura, faz toda a diferença buscar inspiração e aprimoramento em obras dos grandes nomes. Em Radiografia do Homem Ordinário (do livro Cobra de Vidro), Rubens costura a poesia com alusões à imortal Tabacaria, de Fernando Pessoa.

“Agora estou com os sonhos de todo mundo/ agora estou com a candura dos vinte anos/ rangendo e desfiando minhas fibras, perdi todas as provas/ como não tinha artimanha, quem sabe fosse idolatria/ não tenho o carro e a lógica dos imperadores./ As lições de malícia perdera-as na floresta./ Fui até outros campos e só encontrei veneno e cogumelos/ E quando ancorava, com grande revalia, a ilha era sempre idêntica […]”.

Ao lado dos poemas de Fernando Pessoa, os contos de Franz Kafka despontam como os preferidos de Rubens na fase adulta. Ele os entende como um espelho do mundo burocratizado que vive a sociedade. “Um conto do Kafka que me marcou é A Construção, porque é sufocante, a gente se sente como um animal numa toca tentando sair”, observa.

A relação de leitor e autora com a brasileira Clarice Lispector, embora travada no início, se mostrou promissora conforme crescia o grau de compreensão de sua literatura. Rubens diz que leu sua obra da primeira vez e não entendeu nada. “Mas quando você faz uma leitura sem compromisso, ela te fisga e te traz para dentro da história. Você começa a fazer uma autoanálise e se não tiver coragem, você para de ler porque ela é muito envolvente”, emenda o escritor. “Eu vi livros dela até no Japão”, atesta.

Os clássicos já nascem eternos. Ao menos, é nisso em que acredita o escritor. São como pinturas de grandes mestres: toda vez que olhamos para elas, notamos um detalhe que passara despercebido até então. “Literatura boa é isso, você deve transmitir uma mensagem, instalar um mistério nas entrelinhas. Sempre que lê as grandes obras, você é capaz de descobri uma coisa nova”, ressalta.

 

Blog de Rubens Shirassu Jr.
Conheça o trabalho do escritor

 

Literatura: Livros que inspiram canções

Muitos clássicos da literatura universal foram referências para composições de músicas, acompanhe:

“For whom the bell tolls”, Metallica
Inspirada no livro “Por quem os sinos dobram”, de Ernest Hemingway, que utilizou a sua experiência pessoal na Guerra Civil Espanhola para compor o romance, assim como no poema de mesmo nome de John Donne.

“Admirável Chip Novo”, Pitty
O primeiro álbum da Pitty tem várias inspirações em obras literárias. E essa música é uma referência ao romance “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley.

“1984”, David Bowie
Parte do álbum “Diamond Dogs”, com músicas inspiradas no romance homônimo de George Orwell.

“Tom Sawyer”, Rush
Inspirada no protagonista que dá nome ao romance de Mark Twain.

“The Fool On The Hill” – The Beatles
O livro “The History of Tom Jones, a Foundling”, do inglês Henry Fielding, mais conhecido como “Tom Jones” foi a referência dos Beatles para compôr a canção The Fool on the Hill”, do disco “Magical Mystery Tour”.

Luiz Dale

Quando pequeno, Luiz Dale, 30 anos, hoje jornalista e especialista em Cinema e Documentário, trabalhava numa videolocadora perto de sua casa. Algumas vezes, escondia alguns filmes que queria ver para ninguém alugá-los antes. Assim, conheceu suas primeiras grandes paixões cinematográficas. E nunca mais deixou a sétima arte sair do cartaz de sua vida.

O cinema entrou cedo na vida de Luiz Dale e nunca mais saiu do cartaz de sua vida (Crédito: Violeta Araki)

“A minha primeira referência foi o cinema moderno. Tive muita influência do Steven Spielberg, James Cameron, George Lucas. Para um garoto naquela época era muito comum ser fisgado pelos clássicos do cinema fantástico. E.T., Stars Wars, Jurassic Park, por exemplo”, diz.

Na entrevista a seguir, Luiz fala sobre o cinema na atualidade e mostra sua visão sobre os filmes clássicos.

ENTREVISTA

Revista Prisma: Como foi o seu desenvolvimento de seu gosto pelo cinema? Quais vertentes você descobriu?

Luiz Dale: Quando você cresce e começa a estudar, passa a ser atraio por alguns gêneros mais nobres, como cinema europeu, cinema chinês. Aos 18 anos, mergulhei no cinema clássico. Conheci também o gênero japonês [Luiz morou no Japão durante dois anos]. Então percebi que o cinema não era só um hobby. Era uma paixão.

Revista Prisma: Por que assistir ao cinema clássico?

Luiz Dale: O cinema clássico é referência até hoje para os novos cineastas. O simbologismo, os arquétipos e a linguagem desse cinema são utilizados ainda atualmente. Quer dizer, tudo o que se viu em Casablanca, E o Vento Levou…, está presente nos filmes de hoje.

Revista Prisma: O que faz um filme se tornar clássico?

Luiz Dale: É o tempo que diz isso. Apesar de que nos Estados Unidos os veículos especializados, os críticos, os jornalistas, eles têm muita influência na formação de um clássico. Existem alguns filmes que na época não foram bem aceitos, mas com o passar do tempo, acabaram se tornando “cults”. Foram ignorados pelo público e pela crítica na época, e depois de uns 10, 20 anos, ganharam importância estética, artística e cultural. Posso citar, por exemplo, o filme chinês Amor à Flor da Pele (Imagem Filmes, 2001).

Revista Prisma: Como você enxerga o cinema atual?

Luiz Dale: Eu costumo falar que o cinema está numa crise de oferta criativa nesses últimos anos. Acho que esta oferta criativa nunca falta no cinema de animação. Especialmente a Disney e a Pixar são as produtoras que possuem a melhor e a mais diversificada oferta criativa no mercado, tanto é que dificilmente um filme deles não dá certo. Por outro lado, antigamente o cinema menor ou chamado de independente era muito forte, ele chegava com frequência ao expectador. Mas hoje, como se produz menos, está se produzindo com uma qualidade mais interessante.

Revista Prisma: E o que você diz sobre o cinema 3D?

Luiz Dale: Ele trouxe novamente as pessoas para uma sala de cinema como uma opção de entretenimento. Por outro lado, o que se tem em 3D é preocupante. Acho que a estrutura das salas não está preparada para o cinema 3D, essa é uma grande questão. Isso não acontece só aqui. E os filmes em 3D dominam a programação de uma praça de cinema e em consequência disso, não se tem opções de outros gêneros. Por conta disso também, as produtoras estão produzindo mais filmes desse tipo. O setor exibidor, que estava passando por uma crise forte, hoje está mudando realmente o cenário, é ele quem está dando as cartas agora.

Revista Prisma: Quais foram os últimos grandes filmes a que você assistiu?

Luiz Dale: O tigre o dragão (Columbia Pictures do Brasil, 2001) acredito que esse é o filme mais completo que eu já vi. Eu o tenho como o melhor filme de todos os tempos. Ele foi dirigido pelo Ang Lee, um diretor que teve muita influência do cinema clássico e moderno americano. Bom, falando nas boas exceções do 3D também cito As aventuras de Pi (também é do Ang Lee) e A invenção de Hugo Cabret (de Martin Scorsese). Mas aí é que está: são filmes que foram feitos por diretores influenciados cinema clássico, são diretores influentes no cinema moderno e agora estão tentando fazer algo diferente com o cinema 3D.

Revista Prisma: Como as referências nessa área ajudam em seu trabalho de crítico de cinema?

Luiz Dale: Tendo referências, você consegue identificar características do cinema clássico, do contemporâneo, os arquétipos, alguns movimentos de câmera que remetem a tal diretor e perceber que em alguns momentos este diretor está citando Hitchcock, por exemplo. Isto te dá um comparativo. Quando se compreende as características desses movimentos cinematográficos, é fácil identificá-los em outras obras.

 

Das páginas às telas: histórias saem do papel e ganham vida em filmes

Há muitos exemplos de filmes baseados em livros, sendo que na maioria das vezes, o roteiro original é adaptado para o cinema. Romeu e Julieta, O Conde de Monte Cristo, Harry Potter, O curioso caso de Benjamin Button, Ensaio sobre a cegueira, Orgulho e Preconceito, Laranja Mecânica são só alguns títulos da longa lista que você confere aqui:

Filmes baseados em livros
Só em 2013, mais de 20 filmes baseados em obras literárias estrearam no cinema:
http://www.saraivaconteudo.com.br/Materias/Post/49460

Lista de vários filmes baseados em livros
http://www.cinedica.com.br/Lista-De-Filmes-Filmes-Baseados-Em-Livros46.php

Galeria de fotos

Quer conhecer as referências culturais da Vanessa Olha só!